Vagas (só) de moto em prédio de alto padrão na Vila Madalena (zona oeste de São Paulo)

Meu automóvel não quer mais morar comigo

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Vende-se apartamento alto padrão, bairro nobre, pé-direito alto, academia, sauna, churrasqueira, varanda gourmet e… nenhuma vaga de garagem. O quê!? Nenhuma vaga? Onde vou guardar o carro do meu coração?

Pois bem, essa é a nova tendência de apartamento – ou um-dormitório, ou “studio”, se preferir. E não se surpreenda. Vende como água, mesmo para quem é apaixonado por seu carro. Mas qual é o sentido disso?

“A característica desses novos apartamentos que estão surgindo é sem vaga. Houve um em que todas as unidades foram vendidas em um único dia, no lançamento, antes das 11h da manhã”, afirma José Roberto Esteves Mendes, coordenador de produto da incorporadora Even.

Segundo ele, o perfil de quem compra esse tipo de imóvel é formada por profissionais liberais, pessoas separadas, homens ou mulheres que pretendem morar sozinhos, mas com praticidade a que tem direito. Um empreendimento na Vila Madalena (zona oeste de São Paulo) tem vagas demarcadas – só para motos. Outro nos arredores, da mesma construtora, nem espaço para moto terá – apenas bicicletários.

“Toda quebra de paradigma exige coragem, gera reação e depois aceitação. Hoje, o mercado aceita bem a falta de vaga de garagem para determinadas localizações e tipos de produto”, afirma Luciano Amaral, diretor-geral da Benx Incorporadora que tem como foco de atuação empreendimentos de alto padrão e uma linha específica para projetos econômicos de qualidade.

Segundo ele, mais do que uma forma de aproveitar melhor o espaço em que ficaria o carro, trata-se de “uma adequação do mercado. Reduz o custo e também o preço”. Sim, condomínio e Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) chegam a baratear entre 20% e 30%. Na ponta do lápis, o dono do imóvel muda seu comportamento. Com R$ 200 ele aluga uma vaga integral em bairro nobre.

Mas afinal, como é o modus operandi dos que têm de uma relíquia da qual não abre mão até um carrão importado? “Simples: a pessoa deixa o carro no estacionamento ou aluga uma vaga em um prédio próximo, gasta uma ninharia de aplicativo e em poucos minutos está em casa”, diz o corretor Lothar Werninghaus, com a autoridade de quem trabalha há cerca de duas décadas como consultor técnico da Audi e hoje ganha a vida como corretor de imóveis.

No afã de vender, muitos corretores (ou consultores de venda, como preferir), costumam afirmar que os compradores desse tipo de apartamento ou não têm carro ou são investidores que compram entre dois e 12 unidades para alugar. Geralmente são prédios próximos a faculdade. Ou melhor, são edifícios perto de tudo, sobretudo de estações de trem e metrô. Mas essa afirmação não encontra respaldo na realidade. “Oitenta por cento dos compradores desse tipo de apartamento o adquire para morar”, conta a gerente de vendas e responsável técnica da construtora Toledo Ferrari, Lenita Moreno.

“Está longe de ser só investidor quem compra esses apartamentos pequenos hoje em dia. São solteiros, mas tem até casal, usuários de aplicativos, metrô e deixam o carro para fazer uso mais racional em uma garagem.” Segundo ela, a incorporadora tem prédios de 52 metros quadrados que servem a um casal, mas com apenas uma vaga. Mas tal mudança não é só comportamental. Tem a ver com o novo Plano Diretor paulistano, que prevê, em linhas gerais, no máximo uma vaga para apartamentos acima de 40 metros quadrados e duas vagas para unidades acima de 70 metros quadrados.

“Com a mobilidade urbana, o comportamento mudou. Tenho um cliente dono de um BMW que mora em um apartamento a poucos metros do estacionamento onde para o veículo”, diz o corretor David Santos, que se recusou a passar o contato desse cliente para uma entrevista.

“São pessoas reservadas, de alto poder aquisitivo. Querem mais o sigilo. Encantam-se com as atrações da região central de São Paulo. Esse meu cliente, por exemplo, mora em um apartamento de 24 metros quadrados na rua Marquês de Itu”, entrega. “No meu caso, não vou pegar nem aplicativo. Tem estacionamento a uns 50 metros da entrada do meu prédio, que é uma rua relativamente pacata de Pinheiros”, conta um comprador, que pede sigilo sobre sua identidade. Pelo visto, é o futuro. Seu carro não vai mais morar com você.

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