Quem acompanha o mercado automotivo há mais de 20 anos presenciou uma verdadeira transformação em como as marcas e seus concessionários encaram o negócio de pós-vendas como um todo. O que antes era um “mal necessário”, hoje é uma das principais tábuas de salvação do negócio de centenas de concessionárias.

Por CARLOS CAMPOS

Acelerando com Serviços

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Indicadores de produtividade, eficiência, taxa de absorção, taxa de agendamento, certo da primeira vez, giro de estoque e outros índices são cada vez mais monitorados diariamente pela alta gerência das concessionárias. Ainda há muito a ser feito, mas, se olharmos o negócio de pós-vendas, há duas décadas muitos deram verdadeiros saltos qualitativos nas operações de serviços e peças e na forma com que são gerenciados.

Apesar de todas as melhorias percebidas nestes últimos anos, ainda encontramos várias áreas e processos que não são geralmente bem executados, garantindo à rede um ótimo potencial de melhoria em seus resultados. Não querendo tratar toda e qualquer oportunidade, mesmo porque isto depende de cada operação, apresento abaixo alguns pontos mais frequentemente observados:

Agendamento

Em serviços, tudo começa com um bom processo de agendamento. Aqui a chave é agendar o serviço completo, desde a recepção até sua execução, bloqueando o box e o produtivo. Parece simples e óbvio, mas não é. Um bom agendamento irá exigir processo, capacitação e sistemas, e a integração destes três elementos não é tão simples de ser obtida.

Existem oportunidades na ação proativa do agendamento. Normalmente as concessionárias não ligam para os clientes buscando chamá-los para executar serviços preventivos. Há toda uma dificuldade de se obter a quilometragem atual do cliente, é verdade, mas, acima de tudo, falta priorização gerencial desta atividade. Com um bom planejamento de informações com o histórico do consumidor, scripts bem elaborados e pessoas capacitadas técnica e comportamentalmente (me desculpem os estagiários, mas esta não é uma atividade para vocês) é possível gerar volume adicional de passagens bastante substancial, além de promover relacionamento e gerar satisfação nos clientes.

Cabe também falar da oportunidade de se monitorar indicadores-chave na operação de agendamento. O percentual de serviços agendados (em número de OSs e em horas) sobre o total executado e sobre a capacidade instalada são aspectos importantíssimos de serem monitorados. Outro indicador relevante e que normalmente não é bem monitorado é o tempo médio necessário em dias para se atender a um pedido de serviço de um cliente. Qualquer coisa superior a uma semana indica que a concessionária pode estar com problemas de capacidade ou de produtividade. Além da possível perda de receita, há o risco de insatisfação do cliente; assim é muito bom ter este indicador na ponta do lápis.

Integração com novos

Dezenas de clientes vêm realizar seus serviços diariamente na concessionária. Muitos deles estão em fase final de garantia e outros tantos já no período fora de garantia. Um belo percentual já é da casa, ou seja, compraram o seu carro naquela mesma concessionária ou fazem suas manutenções habitualmente lá. Assim, todos os Clientes agendados deveriam ser passados para o departamento de vendas.

Uma estratégia de seleção de possíveis oportunidades de vendas pode ser perfeitamente realizada levantando-se o histórico de cada cliente. Preparar uma pré-avaliação do usado, realizar uma pré-aprovação de crédito e separar algumas opções de carros para test-drive pode ser uma boa maneira de executar vendas sem necessidade de fazer propaganda. Uma estratégia como esta, no mínimo, restabelece os laços entre aquele cliente e a área de vendas, obviamente com preferência ao vendedor que lhe vendeu o carro atual, promovendo um vínculo maior de relacionamento para quando este cliente estiver interessado em trocar de veículo.

Execução de serviços

Entendimento detalhado da necessidade do cliente, conhecimento técnico, ferramental correto e disponibilidade de peças são os elementos centrais para uma boa execução do serviço. Nem sempre estes 4 pilares da oficina estão presentes. Vale olhar de perto como está cada uma destas variáveis para assegurar uma perfeita execução do serviço.

Entretanto, hoje não basta fazer certo. Em serviços, tempo é dinheiro. Assim deve-se fazer certo e rápido. Por isso, vemos várias marcas com iniciativas de melhoria de eficiência na execução de serviços rápidos. Serviços até 2 horas geralmente representam 80% do volume de uma oficina. Portanto, focar em reduzir o tempo de execução de serviços de manutenção, por exemplo, é uma excelente forma de aumentar os resultados operacionais desta unidade de negócios. O uso de dois técnicos no mesmo carro, trabalhando de forma sincronizada está sendo usado por várias marcas com bastante sucesso. Está aí uma prática a ser considerada.

Outra oportunidade de melhoria sobre este tema é o controle de retornos. Difícil encontrar uma concessionária que faz isso direito. Serviços que representam retorno normalmente não são registrados. A oficina “encaixa” o carro do cliente para não ser penalizada. Está tapando o sol com a peneira, perdendo a oportunidade de descobrir onde e como melhorar.

Pneus e rodas

Uma grande oportunidade de negócios é a venda de pneus aos clientes. Eles estão deixando o carro para manutenção, e não existe momento mais conveniente para eles que realizar uma revisão e aproveitar para trocar os pneus. Infelizmente, a maioria dos concessionários não exploram isso com a devida atenção. Não expõem produtos, não colocam a verificação dos pneus no roteiro dos consultores e tampouco possuem condições especiais de parcelamento para incentivar os clientes a realizarem a troca, o alinhamento e o balanceamento.

O recondicionamento das rodas é também uma oportunidade interessante. Rápido, financeiramente atrativo e de alto impacto estético, este serviço aumenta o ticket médio e também a satisfação dos clientes.

Locação de carros

Nos EUA várias marcas possuem a unidade de negócios de “Rental Car” fruto da busca do oferecimento de conveniência ao cliente de serviços. Quem está acostumado a dirigir carro, não gosta de andar de táxi, muito menos de ônibus ou metrô. Se existe a possibilidade de locar um carro a um preço razoável, mesmo que seja um pouco mais do que iria gastar com o táxi, mas podendo parcelar a locação em 2 ou 3 vezes, certamente será uma oportunidade de novos negócios. Além disso, a locação de carros gera uma oportunidade para vendas, na medida em que o cliente testará um carro novo da marca.

Nos EUA, a Lexus vai além. Ela empresta um carro, normalmente um nível acima do carro atual do cliente, para ele passar o dia. Uma estratégia absolutamente fascinante de conquista de lealdade. Para citar alguns outros exemplos, a Nissan e a Renault nos EUA, na Europa, Japão e em alguns países da América do Sul também, possuem operações da rede dedicadas exclusivamente à locação de veículos da marca. A busca por novas oportunidades que gerem receita e elevem o nível de serviços aos clientes é uma tendência que veio para ficar.

Serviços fora de garantia em outras marcas

Uma iniciativa que tem dado muito certo é o Quick Lane da Ford nos EUA e agora aqui no Brasil também. A ideia é dar à rede de distribuidores Ford a oportunidade de vender serviços rápidos de conveniência a clientes de todas as marcas em uma unidade de negócios fisicamente separada ou anexa à concessionária. Além de uma nova oportunidade de negócios que gera sustentabilidade financeira, a Ford aproxima a rede aos clientes de marcas concorrentes, promovendo oportunidades interessantes de conquista destes para a marca.

CRM e iniciativas de lealdade

Há uma grande diferença entre CRM e iniciativas de conquista da lealdade dos clientes. Muitos concessionários veem o CRM e lealdade como a mesma coisa. Um bom CRM contribui para fomentar a lealdade, mas apenas isso. Lealdade é criar vínculos emocionais com o cliente.

Muitos concessionários buscam fazer ações de relacionamento quando o Cliente está para trocar de carro, ou seja, após 3 ou 4 anos de uso. Isto está errado. Devemos nos relacionar com o cliente periodicamente, desde o primeiro ano. Deve-se buscar maximizar o “período de lua de mel”, que ocorre após a venda do veículo.

As primeiras visitas de serviço serão provavelmente as de manutenção periódica, com pouca adição de despesas extras para os clientes. Uma estratégia eficaz de retenção deve empregar um plano para proteger os gastos com as visitas no fora de garantia e que são as mais rentáveis. Lembretes de serviço aliados com programas de recompensas ao cliente podem trazer resultados surpreendentes. O mais importante em termos de relacionamento é estabelecer confiança com o cliente, sem isso não há possibilidade de uma relação duradoura.

Ponto crucial para isso é a postura dos consultores de serviços. O primeiro termo de seu cargo já diz tudo: consultores vêm de consultoria e, portanto, devem ativamente compreender as necessidades dos clientes e prover conselhos e recomendações. Uma coisa é vender serviços, outra coisa é o cliente perceber o real interesse da concessionária no seu bem-estar e na qualidade de manutenção do seu carro. Pequenas dicas de uso e manutenção do carro e a sincera recomendação do momento certo de realizar determinado serviço construirão no cliente a sensação de que está em boas mãos.

A agressividade tanto em vendas como em pós-vendas só prejudica os resultados da empresa, pois se engana aquele concessionário que pensa que o cliente não se sente lesado e não busca uma alternativa de manutenção do seu carro em uma próxima oportunidade.

Todas as iniciativas que permitam explorar melhor o ciclo de vida do cliente devem ser pensadas e consideradas com muito carinho, pois são fontes únicas de negócio e também de fortalecimento do relacionamento, portanto, de conquista de sua lealdade.

Quando a economia vai mal e há um ambiente generalizado de incertezas, há uma tendência natural de os clientes procurarem realizar mais manutenções ao invés de trocarem seus veículos. Este aumento na oficina pode e deve ser potencializado pelas concessionárias e, neste mercado parado de vendas, o jeito é acelerar com o pós-vendas.

Carlos Campos é Sócio Diretor da Prime Action Consulting

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